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“Feliz dia da geladeira!” — por Vanderli do Carmo Rodrigues

Uma reflexão ácida e nostálgica que usa o humor de A Família Dinossauro para questionar consumo, comodidade, empatia e os verdadeiros valores por trás do Natal.

Por: Redação Fonte: Garça em Foco
18/12/2025 às 08h04
“Feliz dia da geladeira!” — por Vanderli do Carmo Rodrigues

“Não é a mamãe, não é a mamãe, não é a mamãe!” 
Se você tem mais de 30 anos, provavelmente conhece a frase, e consequentemente conhece a série.
Era difícil não se encantar por aquele bebê dinossauro e querer apertar – ou entrar na fila pra atirá-lo na parede. 
“A família Dinossauro”, série da década de 90 trazia temas ácidos que nos faziam além de rir, pensar um pouco na realidade humana espelhada nos pesadões de escama. Todos os personagens da série original traziam sobrenomes de empresas petrolíferas. Coincidência? Não, apenas humor com uma pitadinha de maldade. Retratada um pouco antes da extinção dos dinossauros, aliás, não foi um meteoro que os extinguiu, e sim o descaso com a natureza e a desinteligência da espécie dominante. 
Pausa para pensar...
A trama se passa sobre o grande continente Pangeia, enquanto ele se separava lentamente e faltava algo em torno de 65 milhões de anos para que os profetas nascessem por aqui, mas já existia por parte dos habitantes primitivos a luta entre o certo e o errado. Cada episódio novo trazia um conflito diferente: Como tratar os idosos, o uso de drogas, machismo, racismo (entre dinossauros e os humanos que eram os selvagens da trama), extinção de animais... E aquele episódio onde eles comemoravam o dia da geladeira.
Acontece que o dia da geladeira era o dia mais importante do ano, um evento que determinara um marco no tempo, um antes e um depois. Época em que eles enfeitavam a casa, trocavam presentes, recebiam abonos e as crianças esperavam ansiosas pela véspera e o amanhecer do tão esperado dia... Lembrou algo? Bom, não foi por acaso...
A intenção de quem produziu foi exatamente essa, talvez por desacreditar do marco natalino, ou cansado do desvirtuamento de valores tão comuns nesta época, ou quem sabe apenas usando do humor negro que era tão característico da série. Não dá para saber... O que eu sei é que o dia da geladeira era uma comemoração à maior invenção da história Jurássica, pois graças à caixa que produz gelo, os machos dinossauros pararam de caçar todos os dias, eles puderam fixar moradia, começaram a armazenar comida e a vida ficou boa e mansa, entre o coçar e o arrotar. 
Pausa para pensar novamente...
Deixando a fictícia era Jurássica, já nos dias atuais, o que talvez você não saiba, e que talvez te faça pensar um pouco mais, é que a ideia de criar uma máquina que produzisse gelo, nasceu do médico John Gorrie, lá pelos anos de 1838. Dedicado e preocupado com o conforto dos seus pacientes, ele idealizou e criou o utensílio, que décadas depois seria adaptado para as cervejarias e matadouros, e foi somente a partir de 1913, com as primeiras geladeiras domésticas, que a invenção viria a se tornar o eletrodoméstico primordial dentro de um lar. 
A invenção da geladeira possibilitou muita coisa, ter algo frio para os dias quentes, estocar comidas, ostentar para as visitas menos abastadas, ou apenas poder levantar no meio da noite e fazer um lanchinho. Pois como o próprio “Dino da Silva Sauro” disse, é muito incômodo sair para caçar de pijama e usando chinelos...
Os primeiros matadouros tiveram origem em Chicago e nasceram com o invento dos refrigeradores, por volta de 1860, transformando pais de famílias desesperados em frios assassinos de animais. Um trabalho sujo, que ninguém queria fazer, onde a classe pobre era contratada, colocando nas mãos daqueles considerados “escória” a faca que ninguém queria segurar.
Após os refrigeradores industriais, os frigoríficos adaptaram a tecnologia para os caminhões e caçar o próprio jantar virou coisa de selvagem, e assim, para atender a demanda de uma sociedade evoluída e requintada, a carne passou a ser levada para longe, dias e dias de viagem. E se tem um “selvagem” recebendo para matar dez por dia, por que não matar o dobro? Ou o triplo? A demanda pela carne cresce, e comer carne deixa de ser um artigo de luxo, para virar uma “necessidade” das famílias; e nascem muitas crenças, ou apenas justificativas para o consumo: sem carne seu corpo enfraquece, os animais nasceram para isso, já está morto mesmo, Deus fez os animais para nos servir, e haja frases feitas... 
Só lembrando, para quem talvez não saiba, mas antes deste magnífico invento, o animal era abatido pela própria família. Era algo consciente, com o qual todos os envolvidos, compassivos ou não, tinham que conviver – e dormir. Para armazenar, a carne era salgada e seca virando o charque, ou cozida e enlatada. No caso dos porcos, a gordura era cozida, virava banha e a carne era armazenada dentro dessa pasta. Era o alimento da família por semanas.
A verdade indiscutível é que foi somente após a invenção da geladeira que os comércios de carne aumentaram – aumentaram assustadoramente, vale frisar – e tornaram a vida do ser humano, muito mais cômoda. Por outro lado, essa comodidade tornou a vida dos animais uma miséria, já que dessensibilizou totalmente o ser humano com relação a eles. Um século onde os animais são apenas partes em uma vitrine, filés em uma bandeja, embutidos com nomes chiques, pedaços em espertos. E as nossas crianças, aqueles seres preparados que estão profeticamente nascendo aqui para ajudar na evolução também profetizada, terão que conciliar a suas certezas espirituais com a realidade encontrada aqui no nosso planeta. Nascem vegetarianos e terão que, mesmo antes de aprender a falar, convencer os pais de que comer animais é crueldade, que devemos cuidar deles e não os matar.
Um século onde reverenciamos um eletrodoméstico cheio, sem disfarçar a satisfação de abarrotar o congelador com partes de seres vivos. Seres belos e inteligentes, desmembrados e esquartejados em uma triste visão do desamor. Um hábito que nada tem de normal e nada tem de bonito, mas tão comodamente arraigado, que para ser vegetariano, você precisa antes de tudo, ser um bom advogado da causa, pois eis que é necessário ter argumentos para convencer os acomodados de que quem está errado são eles, e não você. 
O Natal inspira mais que geladeiras cheias e mesas fartas, ele nos inspira amor, inspira a paz dAquele que nasceu para nos deixar o caminho de luz por onde devemos seguir.
Natal ou dia da geladeira? 
Dadas às circunstâncias em que nós vivemos, eu diria dia da geladeira, já que estamos nos curvando a um utensílio, pois que passamos mais tempo preocupados com o que comer do que com o que sentir. 
O Natal está chegando... 
Esqueçam o Sublime Mestre Jesus e Sua mensagem de amor... 
Feliz dia da geladeira para todos!

Vanderli do Carmo Rodrigues

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