No dia 12 de outubro celebramos a Solenidade de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil. A devoção a Nossa Senhora Aparecida, uma das principais expressões da piedade do povo brasileiro, teve início em 1717, com três humildes pescadores.
A partir de uma imagem de terracota da Imaculada Conceição de Maria encontrada no Rio Paraíba, enegrecida, e seguida com o milagre tipo bíblico de uma pesca milagrosa, os pescadores, angustiados para trazer uma pesca e preparar um banquete ao governador que visitava o vilarejo, não sentiram desamparados e abandonados. Viram naquela imagem um sinal de que a Virgem Maria e a proteção de Deus estavam ao lado deles. Apelidaram de Aparecida, pois havia aparecido das águas. E numa devoção muito simples, popular e espontânea a sua história foi se espalhando pelo Vale do Paraíba e por todo Brasil, trazendo romeiros que iam até a imagem para fazer suas orações e pedidos. Com o tempo foi se necessário erguer um santuário. Primeiro, a Basílica, apelidada de igreja velha em 1888. Depois, a partir de 1955, construiu-se o Santuário Nacional com a capacidade de 35 mil pessoas, sendo o segundo maior santuário católico do mundo.
As leituras bíblicas desta festa refletem a importância da Virgem Maria na história da Salvação e seu exemplo como modelo de ser discípulo de Jesus.
A Primeira Leitura (Ester 5,1b-2;7,2b-3) nos fala de Ester, uma jovem judia, que intercede junto ao Rei pela Vida do seu Povo. Texto escrito em tempo de dominação grega, o livro de Ester nos conta a história do povo judeu sob o domínio persa, tempo de rei Assuero ou Xerxes no século V a.C. Na ocasião, o povo judeu estava condenado ao extermínio pelo primeiro-ministro Amã, sem que o rei tivesse consentimento do caso. A judia Ester, feita rainha por obra de Deus, havia conquistado o rei com sua beleza, graciosidade e feminilidade. E salva seu povo. O episódio nos narra este momento.
Deste modo, Ester é figura de Maria que intercede pela Igreja, seu povo. Ela assunta aos céus e imaculada em sua conceição, encanta o grande rei e nosso Deus com sua graciosidade, tornando-se nossa intercessora junto a seu Filho Jesus. Com suas orações ampara os discípulos de seu Filho, filhos da Igreja, socorrendo e consolando em suas necessidades.
A Segunda Leitura, do livro do Apocalipse (12,1.5.13a.15-16a) nos fala de uma “Mulher” que “apareceu” no céu. Ela é um grande sinal: uma mulher vestida como o sol, tendo nos braços um filho, que um dragão quer devorar. A “mulher” é símbolo da Igreja, o “dragão” significa o mal e o “menino” é Cristo. Todas as passagens das Escrituras referentes ao povo fiel a Deus podem ser aplicadas à nossa Mãe, Maria Santíssima. Eis porque essa é apresentada à nossa reflexão nesta solenidade. Maria é modelo de discípula de Cristo e é a imagem perfeitíssima da Igreja. Como dela nasceu por obra do Espírito Santo o Filho do Deus Altíssimo, pois se fez serva humilde do Senhor, também a nós seus discípulos devem nascer Cristo, a Palavra Eterna, em nossos corações, para segui-lo fielmente.
O Evangelho (João 2,1-11), por fim, nos fala das Bodas de Caná. Neste contexto, Jesus realiza o primeiro milagre, o primeiro Sinal de uma realidade mais profunda: mostrar aos homens o Pai, que os ama, e os convoca para a alegria e a felicidade plenas.
A festa do Reino já está acontecendo. Jesus é o Noivo, que já está no mundo, para celebrar o casamento de Deus com a humanidade. A Mulher, a Virgem Maria e Mãe, é símbolo de Israel, símbolo da Igreja, a noiva de Cristo.
O cenário do casamento reflete o contexto da Aliança entre Israel e o seu Deus. A essa aliança, em certo momento, vem a faltar o vinho. O “vinho” é símbolo do amor entre o esposo e a esposa, da alegria e da festa. Constata-se que a antiga “aliança” se tornou uma relação seca, sem alegria, sem amor e sem festa, que já não proporciona o encontro amoroso entre Israel e o seu Deus. Esta realidade de uma “aliança” estéril e falida é representada pelas “seis talhas de pedra destinadas à purificação dos judeus”.
O número seis evoca a imperfeição, o incompleto. A “pedra” evoca as tábuas de pedra da Lei do Sinai e os corações de pedra de que falava o profeta Ezequiel. A referência à “purificação” evoca os ritos e exigências da antiga Lei que revelavam um Deus impositivo, que guarda distâncias. Um Deus assim pode-se temer, mas não amar. As talhas estão “vazias” porque todo este aparato era inútil e ineficaz: não servia para aproximar o homem de Deus, mas sim para o afastar desse Deus difícil e distante. As “Bodas de Caná sem vinho” representam a situação do povo, desiludido e insatisfeito. O amor foi substituído pela observância da lei.
Todavia, eis que as bodas se transformam pelo pedido da Mãe-Mulher, a Virgem Maria. E ela nos aponta a seu Filho Jesus: “Fazei tudo o que ele vos disser”. Agora Jesus fará a passagem do Antigo para o Novo. E o novo é melhor. Os Personagens são apresentados. A “Mãe” é Previdente, nota primeiro o problema: “eles não têm mais vinho”. É Providente: aponta um caminho que é Cristo. É Perseverante: não desiste diante da aparente indiferença de Jesus. O “Chefe de mesa” representa os dirigentes judeus, que não percebem que a antiga “Aliança” já caducou. Os “Serventes” são os que colaboram com o Messias, que estão dispostos a fazer tudo “o que ele disser” para que a “Aliança” seja revitalizada. É a Jesus que o Israel fiel (a “mulher-mãe”) se dirige no sentido de dar nova vida a essa “aliança” caduca. A obra de Jesus não será preservar as instituições antigas, mas realizar uma profunda transformação. Ele veio trazer à relação entre Deus e os homens o vinho da alegria, do amor e da festa. Isso acontecerá quando chegar a “Hora”, que será na sua Paixão. Jesus acolheu o pedido da mãe e a alegria continuou até o fim da festa.
As Bodas continuam e somos também convidados. Quando a relação com Deus se resume num jogo complicado de ritos externos, de regras e de obrigações que é preciso cumprir, a religião torna-se um pesadelo insuportável que tiraniza e oprime. Jesus veio nos revelar Deus como um Pai bondoso e terno, que fica feliz quando pode amar os seus filhos. É esse o “vinho” que Jesus veio trazer para alegrar a “aliança”: o “vinho” do amor de Deus, que produz alegria e que nos leva à festa do encontro com o Pai e com os irmãos.
Que Nossa Senhora da Conceição Aparecida, a Virgem Mãe de Deus e nossa, sempre peça deste vinho para que não falte em sua Igreja, que não falte essa alegria aos seus discípulos. E para isso, devemos seguir o que ela nos diz nas Bodas de Caná: “Fazei tudo o que ele vos disser”.
Pe. Anderson Messina Perini
Administrador Paroquial da Paróquia Jesus Bom Pastor de Santo André
Mestrando em Teologia PUC/SP