Deixamos o Restaurante Amigo Garimpeiro, que fica na saída do Parque Nacional da Amazônia, com a proa rumando para Jacareacanga. Foram 220 km percorridos ao longo do dia, em sua maior parte sob chuva, um alívio bem-vindo para o calor intenso da região. Muitos imaginam aquela rodovia plana. Estão enganados, pois relevo da estrada é um sobe e desce constante em uma boa parte do trajeto, com traçado sinuoso em várias regiões. A topografia do setor andado é composta por diversos aclives e declives, o que, somado às chuvas, resulta em um percurso bem lamacento e escorregadio. O piso da estrada é repleto de canaletas formadas pelas enxurradas velozes de água, seguindo o sentido do leito da estrada, e que sempre se tornava cada vez mais estreito, abaulado e com valas profundas imediatamente ao lado dos trilhos utilizados pelos demais veículos. Era algo como andar no “fio da navalha”, com o risco eminente e constante de derrapagens para dentro das valas, principalmente nas descidas, justamente onde a velocidade tende a aumentar, e a aderência com o solo se perdia com facilidade. Nessa região está localizada a subida mais desafiadora da Transamazônica: a temida “Ladeira do Mosquito”. É um verdadeiro pesadelo, sobretudo para os caminhões e carretas, que muitas vezes não conseguem vencê-la, seja por falta de tração ou dada a sua forte inclinação, por insuficiência de potência. Mesmo durante a estação seca, o solo extremamente arenoso, dificulta demais a subida desses veículos pesados, agravada por um aclive severo para uma estrada de terra. Com frequência, as carretas embalam, iniciam a subida, mas antes mesmo da metade, começam a patinar, perdem a tração e descem de ré, em velocidade, o que causa diversos acidentes neste ponto crítico da estrada. Chegamos enfim, à Jacareacanga. Esta cidade também é banhada pelo Rio Tapajós, local de balneários de águas mornas. É ali que o Rio começa a se distanciar da BR230. Jacareacanga é altamente frequentada por grupos indígenas originários daquela região. Aproveitei, e finalmente substitui a pedaleira dianteira da minha moto, que havia se quebrado ainda no começo do Parque Nacional da Amazônia. Abastecemos e comemos algo rápido, para podermos seguir em frente. Jacareacanga é a última cidade paraense pela transamazônica. Loading... Loading...
Após mais 40kms aproximadamente, chegamos à divisa dos estados do Pará e do Amazonas, onde fizemos algumas fotos. Uma ponte simples e de madeira divide os dois maiores estados do nosso país/continente por essa importante rodovia brasileira.
Ao entrarmos no Amazonas, as estradas melhoraram significativamente nos primeiros 60 quilômetros. Chegamos com tempo feio e armado para chuva, no Rio Sucunduri. Ali, dormimos em uma pequena pousada. Após um aguaceiro naquela noite, ao amanhecer já foi preciso sair do quarto pisando em grandes poças d´água. Após o reparo de um furo do pneu traseiro da minha moto, retornamos à rodovia ainda pela manhã, mas agora encontrando uma estrada novamente lisa e em piores condições. A floresta do trecho amazonense da BR230 é bem mais preservada que as do Pará. Suas cidades se localizam mais distantes entre si e, vez por outra, passando próximo à sedes de fazendas, além de ramais “entradas” para áreas de garimpos.
Apesar de pequena, Apuí, por ser um polo comercial daquela região, conta com boas lojas, bons postos de combustíveis, oficinas mecânicas de motos, carros e caminhões, centro médico, entre outras atividades. Eu havia perdido minhas luvas ainda na estrada de acesso para Fordlândia, sendo preciso adquirir outra, pois o sol forte castigava muito a pele das mãos.
Esta é outra região habitada por grupos indígenas, sendo que os principais eram os Tenharin e os Diahoy. Na época em que estive na área, em 2007, essas duas etnias cobravam pedágios elevados para permitir a passagem por suas terras, prática sabidamente ilegal. Apesar disso, o governo optou por ignorar a situação, provavelmente em razão do histórico de conflitos entre brancos e indígenas. Durante a travessia pelas aldeias, chamava a atenção o grande número de caminhonetes novas ou com pouco uso estacionadas ao longo da estrada. Para evitar fraudes e garantir que o pedágio fosse pago corretamente entre as tribos, os "recibos" recebiam um carimbo oficial, no qual poderiam ser checados, depois. Tudo isso era possível de observar na foto abaixo.
Hoje em dia já não existe mais o tal pedágio. Era cansativa demais a situação da rodovia antes do KM180, como é conhecido o pequeno distrito de Santo Antônio do Matupi. Um distrito é bairro separado de uma cidade-sede, no caso, o Município de Manicoré. E foi ali que pernoitamos. As ruas daquele lugar por si só equivaliam à um enduro, tamanha falta de manutenção. Daqui em diante, até Humaitá, a estrada piorou expressivamente, sendo que os últimos 50kms foram um grande teste para as nossas Pops. Passaram bem e com louvor, graças a Deus (obrigado, Sr. Soichiro Honda...).
Chegamos à Humaitá e enquanto aguardávamos a balsa, bebemos alguns merecidos refrigerantes gelados, fabricados na região. Enquanto isso, assistimos ao inesquecível pôr-do-sol refletindo dourado nas águas do Rio Madeira.
---------------------------------------- Um dia aprendi que os sonhos existem para tornarem-se realidade. E, desde aquele dia, já não durmo para descansar. Simplesmente durmo para sonhar.